O negócio é dormir sem medo do outro dia. (Raul Seixas)

Na maternidade aos cinquenta

A emoção indescritível, as lágrimas, o friozinho na barriga... é tudo igual, como da primeira vez. Até mesmo achar a maior graça do mundo nas caretas que ele faz e não tirar os olhos de cima um só segundo. Sem contar as dezenas de fotos tiradas a todo instante, idênticas, com a mesma carinha de joelho de sempre. E depois ficar olhando detalhadamente cada uma delas, como se fossem completamente diferentes uma das outras.

Ser pai aos 50 anos (Leo), depois de ter sido aos 29 (João), 30 (Gabriel) e 35 (Miguel – pensei que tivesse tido um filho temporão aqui) não mudou nada.

Os outros é que mudaram.

Os bebês de agora, por exemplo, ficam o tempo todo no quarto da maternidade com a mãe. Antes, vinham apenas para mamar e olhe lá. Agora, só saem do lado da mãe à meia-noite, para ‘dormir’ no berçário. E é ali no corredor do berçário todo iluminado com lâmpadas fluorescentes, feito aquário, que os pais se encontram. Todos de olho na própria cria e, disfarçadamente, nos outros bebês. Ficam reparando/comparando se são melhores que o seu.

Algumas mães também aparecem na madrugada, sonadas, com cara inchada, pegnoir para a ocasião e chinelinhos de pano cortados na ponta, deixando aparecer apenas o dedão, invariavelmente com a unha feita com esmalte transparente. Caminham assim meio de lado, com a mão na cintura, sempre amparadas por alguém. Acham todos lindinhos e fofinhos. Olha aquele ali, o 415, o moreninho, que cabeludo! Japonesinho recém-nascido é uma graça, não é mesmo? Olha só o 504, que cabelinho arrepiado. Fala baixo que o pai é aquele baixinho ali de costas. E o 312, coitadinho, não pára de chorar e as enfermeiras nem ligam. Meu filho ficou uma hora e meia mamando na minha esposa. O meu é o 306.

Os pais de agora parecem filhos. Têm cara de adolescentes. Como aquele de 19 anos que engravidou uma de 16. Até o nascimento do bebê, cada um morou nas suas respectivas casas. Saindo da maternidade, o jovem casal foi democrático: vai morar, alternadamente, uma semana na residência dos pais dele, e outra na casa da mãe dela, 34 anos, separada. Assim, resolveram, ninguém sente ciúmes.

Tem aquele outro, imberbe, cabelos lisos e compridos, pai de primeira viagem. Não tira o olho um só minuto da esposa, também jovem, que já está no segundo (filho e casamento). Foi ela que, segundo ele, deu de mamar uma hora e meia. No que, um outro menino-pai, sarado, muito simpático, imediatamente me diz perto do ouvido: “Uma hora e meia? Como é que pode, se só sai aquele negócio, como é que chama mesmo, ‘colosso’, né? Não sai porra nenhuma do peito da minha mulher e o meu moleque só mama 10 minutos e chora. Uma hora e meia...”

Os pais dos pais de agora parecem amigos do clube. Tem um jovem avô ali, 55 anos, sempre ao lado da filha, magérrima, pernas finas, que pariu dois de uma vez só: menino e menina. Não sei por quê, mas gostou de conversar comigo. Não acreditou que eu estava mais para a idade dele do que para a do genro. Chegamos a combinar uma partida de tênis.

E as mães dos pais de agora? Parecem ex-namoradas. Algumas mais jovens do que eu, o corpinho no lugar e o sorriso das avós. Me olham e conversam comigo como com um pai igual aos filhos ou genros delas. Imagina uma avó olhar diferente para um pai fresco no corredor do berçário, que escândalo!

Também têm os filhos, irmãos do novo filho. Parecem tios e se comportam como tal. Do mesmo jeito que eu me senti quando nasceu minha primeira sobrinha, hoje já mãe de três sobrinhos-netos. Gostam de pegar no colo, apesar de tensos e desajeitados para tal, e colocar o dedo sujo na palma mão do bebê para ele segurar – o que mais fazem. Quando a criança larga o dedo, a brincadeira é ficar passando a palma da mão na cabeça, para sentir o buraco da moleira. Só não gostam de ver o umbigo com aquele cotoco do cordão umbilical.

Meus três filhos mais velhos, dois palmos mais altos do que eu, vivem tirando sarro do pai, dizendo que quando for buscar o irmãozinho na escola, o bedel vai gritar pra todo mundo ouvir: “Leo, o seu avô veio te buscar!” Além de ‘tios’, os filhos fazem as vezes de pai, com planos para o futuro junto com o novo irmão: levar no campo de futebol nos jogos do Corinthians, jogar bola com ele e ensinar a chutar com os dois pés. Essas coisas.

Até a mãe do meu mais novo mudou. De namorada jovem, virou mulher. E ficou a cara da mãe que eu sonhava para os meus filhos, quando nem imaginava que ia ser pai tantas vezes: carinhosa, paciente, responsável, dedicada e apaixonada. Parte da felicidade do pai é achar a mãe certa para os filhos.

Eu continuo com a mesma disposição e vontade de sempre. Pronto pra outra.

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Leonel Prata

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